A ciência das manipulações

Economia Comportamental_ homem irracional contra o econômico# A Ciência das Manipulações

A teoria econômica clássica pressupõe que as pessoas agem de forma racional e buscam maximizar seu benefício. No entanto, na ciência, existe uma corrente que contesta essa suposição, apontando que as pessoas frequentemente agem de maneira irracional, são suscetíveis a emoções, preconceitos e estão limitadas em suas capacidades cognitivas.

No novo material, a ForkLog explica como a economia comportamental mudou a visão sobre as ações das pessoas, por que se tornou influente e com quais desafios se deparou.

Origens: da teoria clássica à psicologia

A teoria econômica por muito tempo baseou-se na suposição de que o ser humano age de forma racional, pesando cada decisão e avaliando os benefícios. De acordo com os modelos clássicos, o valor de um bem depende da sua quantidade para a pessoa: a primeira unidade é extremamente desejável, a segunda é menos, e as subsequentes quase não têm importância.

Com a ajuda de tais ideias e métodos matemáticos, os cientistas tentaram explicar como funciona a economia. Esta abordagem, conhecida como a concepção do "homem econômico", estava na base de muitos estudos. No entanto, na prática, as pessoas muitas vezes agem de maneira diferente. A economia comportamental surgiu como uma tentativa de explicar essas desvios, mostrando que as decisões muitas vezes dependem de fatores aleatórios e independentes, como emoções, pressão social ou distorções cognitivas.

Os aspectos psicológicos do comportamento foram abordados por Adam Smith em "A Teoria dos Sentimentos Morais" (1759). No século XX, a psicologia cognitiva começou a se desenvolver, mostrando que as desvios da racionalidade são sistemáticos e previsíveis. A economia comportamental ganhou contornos claros, tornando-se uma ponte entre a análise do comportamento individual e os processos econômicos. Ela ofereceu uma nova perspectiva sobre mercados, investimentos e políticas governamentais.

Uma das principais contribuições para esta área foi a concepção de racionalidade limitada, desenvolvida pelo pesquisador americano Herbert Simon. Ele mostrou que as pessoas raramente possuem todas as informações necessárias e os recursos cognitivos para tomar decisões ideais. Em vez disso, elas confiam em regras simplificadas que permitem uma orientação mais rápida em situações complexas. Suas ideias tornaram-se a base para a análise do comportamento humano real e estabeleceram as fundações para pesquisas futuras em economia comportamental.

Em 1979, os psicólogos Daniel Kahneman e Amos Tversky publicaram o artigo Prospect Theory: An Analysis of Decision under Risk, que lançou as bases da teoria das perspetivas. Ele descreve como as pessoas escolhem entre alternativas com probabilidades conhecidas de resultados. De acordo com isso, os indivíduos avaliam subjetivamente ganhos e perdas em relação a um ponto de referência, superestimando eventos de baixa probabilidade e subestimando eventos de alta probabilidade.

Kahneman e Tversky mostraram que as perdas são percebidas de forma mais emocional em comparação com aquisições equivalentes: a perda de $100 causa mais desconforto do que a alegria de recebê-los. A escolha também depende da forma como a informação é apresentada — o enquadramento. Por exemplo, as pessoas tendem a escolher uma operação com "90% de sucesso" em vez de uma com "10% de risco", embora ambas as opções sejam idênticas. A teoria das perspectivas mudou as noções de racionalidade e se tornou a base da economia comportamental.

O economista americano Richard Thaler — um dos principais divulgadores da economia comportamental — fez uma contribuição significativa para a ciência, mostrando como pequenas mudanças no ambiente podem influenciar substancialmente o comportamento das pessoas. Seu conceito de "nudge" (nudge) sugere que incentivos bem organizados — como o registro automático em um programa de aposentadoria ou a colocação de alimentos saudáveis ao nível dos olhos na cantina — podem direcionar as pessoas para decisões mais vantajosas sem infringir seu direito à escolha livre.

Thaler também investigou a racionalidade limitada, preferências sociais e problemas de autocontrole, destacando que as pessoas muitas vezes agem contra seus interesses de longo prazo. Em 2017, ele foi agraciado com o Prêmio Nobel e brincou dizendo que gastaria o prêmio "da maneira mais irracional possível", ilustrando assim a natureza humana que estudou por décadas.

Outra importante direção tornou-se a aplicação dos princípios comportamentais aos mercados financeiros, onde a irracionalidade se manifesta de maneira particularmente vívida. O laureado com o Prêmio Nobel de 2013, Robert Shiller, mostrou como fatores psicológicos, como otimismo excessivo ou pânico, levam à formação de bolhas de mercado e crises. Sua análise da bolha das dotcoms do final da década de 1990 e da crise hipotecária de 2008 demonstrou que os mercados nem sempre são eficientes. Shiller enfatizou o papel das "economias narrativas" — histórias e expectativas que moldam o comportamento dos investidores e geram ondas de euforia ou medo.

Irracionalidade em ação: como erramos

Do ponto de vista da economia comportamental, as decisões humanas muitas vezes se desviam de modelos racionais devido a fatores psicológicos, emocionais e sociais. Esses desvios não são aleatórios, mas sistemáticos e previsíveis, o que permite analisar sua influência no comportamento econômico.

A base da direção foram várias ideias-chave que explicam por que as pessoas agem de forma irracional e como essas características se manifestam nas decisões cotidianas, desde compras até investimentos:

  • racionalidade limitada. As pessoas nem sempre tomam decisões ótimas devido a limitações na informação, tempo ou capacidades cognitivas. Elas utilizam heurísticas (regras simplificadas de tomada de decisão), que podem levar a erros. Por exemplo, Kahneman em suas pesquisas apresentou aos estudantes um enigma: "Um bastão de beisebol e uma bola juntos custam 1 dólar e 10 centavos. O bastão custa 1 dólar a mais do que a bola. Quanto custa a bola?" A maioria respondeu rapidamente "10 centavos", embora a resposta correta seja "5 centavos". Isso mostra que as pessoas muitas vezes tomam decisões intuitivamente e depois verificam sua correção. As heurísticas são frequentemente a causa de vieses cognitivos — erros sistemáticos de pensamento, como excesso de confiança, tendência ao status quo ou efeito de ancoragem — que também desempenham um papel importante na tomada de decisões;
  • emoções e fatores sociais. Sentimentos, normas sociais e pressão do ambiente influenciam as escolhas. Por exemplo, um experimento na empresa Western Electric demonstrou que a produtividade dos trabalhadores aumentava com a mudança na iluminação (aumento, diminuição ou retorno ao nível inicial) não por causa da própria luz, mas porque os trabalhadores sentiam a atenção dos pesquisadores que faziam perguntas e monitoravam os indicadores;
  • ineficiência do mercado. O comportamento irracional dos participantes do mercado leva a uma formação de preços incorreta, decisões de investimento não racionais e anomalias de mercado. Thaler mostrou que fenômenos como o efeito janeiro ou o efeito impulso surgem devido a distorções cognitivas — excesso de confiança ou comportamento de manada. Essas anomalias contradizem a hipótese do mercado eficiente, que supõe que os preços sempre refletem toda a informação disponível.

A economia comportamental buscou inspiração na psicologia, mas aplicou seus princípios aos processos econômicos, analisando como a irracionalidade influencia os mercados, a política e as decisões individuais.

Heurísticas: armadilhas da nossa mente

Heurísticas são estratégias de pensamento simplificadas que as pessoas usam para tomar decisões rápidas em condições de incerteza, baseando-se na experiência ou na intuição. No entanto, elas podem levar a distorções cognitivas, pois simplificam informações complexas, ignorando detalhes importantes ou superestimando fatores individuais. Tudo isso leva a julgamentos errôneos.

Há muitas heurísticas e distorções cognitivas, e os pesquisadores regularmente destacam novas. Vamos mencionar apenas algumas delas:

  • efeito de ancoragem. As pessoas tendem a confiar na primeira informação recebida, mesmo que não seja relevante. Por exemplo, quando ao comprar um carro, o vendedor inicialmente menciona um preço de 3 milhões e depois oferece um desconto para 2,5 milhões, o comprador pode considerar isso um bom negócio, embora o preço de mercado do carro seja de 2 milhões;
  • efeito de reflexão. As pessoas evitam o risco em ganhos, mas buscam risco em perdas. Por exemplo, a maioria escolherá um ganho garantido de $300 em vez de uma chance de 80% de ganhar $400, mas preferirá o risco de 80% de perder $400 em vez de uma perda garantida de $300;
  • tendência ao status quo. As pessoas preferem manter a situação atual, mesmo que mudanças possam ser mais vantajosas. Devido ao medo do desconhecido, a pessoa continua a manter o dinheiro em uma conta bancária de baixo rendimento, apesar da possibilidade de investir em ativos mais lucrativos;
  • efeito de posse. As pessoas atribuem um grande valor às coisas que já possuem. O proprietário de um carro antigo pode recusar-se a vendê-lo pelo preço de mercado, porque o considera confiável e está acostumado a ele;
  • efeito de framing. A formulação da questão ou proposta influencia a escolha: os compradores tendem a escolher carne descrita como "95% magra" em vez de "5% gorda", embora ambas as descrições sejam idênticas;
  • heurística da disponibilidade. As pessoas avaliam a probabilidade de um evento com base em quão facilmente conseguem lembrar exemplos. Assim, após notícias de desastres, as pessoas têm mais medo de voar;
  • *heurística da representatividade.*As pessoas julgam a probabilidade de um evento com base em estereótipos ou semelhanças com um caso típico, ignorando estatísticas. Por exemplo, ao contratar um funcionário, o empregador pode escolher um candidato que "parece um gerente bem-sucedido", mesmo que sua experiência seja menos relevante do que a de outros;
  • erro do jogador. As pessoas acreditam que podem influenciar eventos aleatórios. Um jogador de cassino acredita que sua "estratégia" de pressionar o botão na máquina aumenta suas chances de ganhar, embora o resultado seja determinado pelo acaso.

Baseando-se nessas características do pensamento, a economia comportamental procura mostrar que o comportamento econômico não é apenas um cálculo de benefícios, mas sim uma interação complexa entre psicologia, emoções e normas sociais.

Impulsionamento ou manipulação? Ética e disputas

A economia comportamental não escapou da crítica, que muitas vezes vem de defensores da teoria econômica tradicional. Cientistas como Milton Friedman, Gary Becker e Eugene Fama acreditam que as pessoas, agindo em condições de concorrência e tendo acesso ao conhecimento, mesmo que não seja sempre perfeito, ainda assim se aproximam do comportamento racional.

Friedman em seus trabalhos enfatizou que os modelos econômicos não precisam descrever com precisão o comportamento, desde que consigam prever com sucesso os resultados do mercado. Fama, conhecido como o autor da hipótese do mercado eficiente, argumentou que as anomalias apontadas pelos economistas comportamentais são frequentemente explicadas por fatores racionais ou pela falta de dados, e não por irracionalidade sistemática. Segundo os defensores das teorias tradicionais, o verdadeiro mercado, com sua dinâmica e oportunidades de aprendizado, faz com que as pessoas tomem decisões próximas ao ótimo, o que torna as conclusões da economia comportamental, baseadas em experimentos, não totalmente aplicáveis a situações complexas.

O ceticismo dos críticos também se dirige aos métodos utilizados na economia comportamental. Experimentos e inquéritos, que estão na base de muitos estudos desta área, estão sujeitos a distorções sistemáticas. Os respondentes podem demonstrar viés ou comportamento estratégico, e suas respostas nem sempre refletem preferências verdadeiras.

A economia tradicional enfatiza as preferências reveladas — aquelas que se manifestam em ações reais, e não nas declaradas em pesquisas. David K. Levin, no livro Is Behavioral Economics Doomed? (2012), aponta o problema da motivação insuficiente dos participantes dos experimentos, o que pode reduzir a confiabilidade dos resultados. Levin também criticou a economia comportamental pela tendência de criar uma nova teoria para cada novo fato, em vez de buscar um modelo explicativo único.

Mais um aspecto controverso diz respeito à ética. O psicólogo Nick Chater expressou preocupação de que o conceito de "nudging", proposto por Thaler, possa ser visto como um apelo à manipulação, especialmente se as pessoas não perceberem que suas escolhas estão sendo direcionadas. Essa questão reflete a dilema entre a liberdade de vontade e as tentativas de melhorar as decisões através de mecanismos psicológicos. Assim, a economia comportamental, apesar de seus sucessos, continua a ser um campo de debates acalorados, onde colidem diferentes visões sobre a natureza do comportamento humano e os métodos de seu estudo.

Economia com rosto humano: o que vem a seguir?

A economia comportamental está a desenvolver-se ativamente, integrando-se com outras disciplinas, como a neuroeconomia (estudo do cérebro durante a tomada de decisões), finanças comportamentais e análise de grandes dados. O uso da inteligência artificial permite estudar o comportamento em tempo real, criando modelos mais precisos.

Muitos países estão criando unidades especiais (, como o Behavioral Insights Team no Reino Unido ), que aplicam abordagens da escola para resolver problemas sociais: aumentar a disciplina fiscal ou melhorar o comportamento ambiental. No marketing, princípios comportamentais são ativamente utilizados para formar a demanda: o efeito de ancoragem é utilizado na formação de preços (, como descontos em relação ao "preço inicial" ), a aversão à perda é usada em promoções com prazo limitado ( "Restam dois lugares!" ), e a influência social é aplicada em avaliações e classificações ( "90% dos clientes recomendam" ). O design digital e as finanças também utilizam o nudging, simplificando a escolha (, assinaturas automáticas, interfaces intuitivas ) e aumentando o envolvimento.

A economia comportamental considera o ser humano não como uma máquina racional, mas como um ser complexo cujas decisões são moldadas pela psicologia, emoções e fatores sociais. Ela não apenas explica por que as pessoas agem de forma irracional, mas também oferece ferramentas para gerenciar seus desejos e ações.

Do impulso na política pública até a análise de crises financeiras - as ideias da economia comportamental encontram aplicação em processos reais, estimulando discussões sobre o equilíbrio entre liberdade de escolha e comportamento direcionado. A área continua a ser influente, oferecendo uma perspectiva única sobre a interação entre o ser humano, as instituições e a economia em condições de incerteza.

Texto: Anastásia O.

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